Quando nasceu o dia, despertei... e vi à janela uma gaivota enorme que espreitava para o quarto e dava bicadas no vidro.
Ainda meia adormecida percebi que estava no quarto do hospital. Comecei a sentir o corpo, o braço direito estava com gesso e doía, os joelhos tinham feridas e doíam, o ombro direito tinha ferida e doía, esforcei-me para me virar e estava cheia de dores nas costas.
A noite tinha sido interrompida, talvez de hora em hora... ora mete termómetro, ora mede tensão, ora injecta analgesico,...ora,... ora... que noite!
Percebi que ia passar ali alguns dias, pelas dores que sentia e porque tinha sido operada ao cotovelo no dia anterior.
Dia anterior!!!!
Que dia fantástico que estava a ser!
Tinha saído com os meus filhotes e afilhada para um pic nic. Tudo indicava que nos íamos divertir imenso, a minha disposição era total para lhes dedicar um dia fantástico. Passeamos, conversámos, jogámos a bola até que me apeteceu pegar na trotinete e experimentar uma aventura mais radical.
Quando dei conta... estava estantelada no chão, com os miúdos assustadíssimos à minha volta e dois senhores a ajudar-me a levantar.
Que vergonha tamanha quando um dos senhores me diz:
- Oh minha senhora, você já não tem idade para estas coisas!
Com muito custo levantei-me e não quis mostrar muita dor, para não assustar os miúdos mas eu sentia-me toda partida e pensava:
- Eu só queria brincar!
Claro que a brincadeira teve de acabar, ao fim de dez minutos já estava a ligar para o meu "cherry" a pedir-lhe para me vir buscar e me levar ao hospital, pois quanto mais os minutos passavam... mais tudo me doía.
Por isso é que estou aqui, na cama do meio numa enfermaria. Á direita a D. Maria e à esquerda a D. Ana, com histórias também bizarras.
Realmente quando somos sensíveis para olhar o mal dos outros... isso pode ajudar-nos a perceber que não nos devemos lamentar, mas lutar, é que há sempre alguém que está bem pior do que nós.
A gaivota voltou à janela. É tão grande e elegante!
Estar no hospital.
Por muito bom que seja um hospital, parece-me que ninguém gosta de lá estar e ninguém está lá por vontade própria.
Não posso dizer que não cuidaram bem de mim enquanto lá estive. Mas ao longo destes dias foi possível observar, o ambiente de quem trabalha com os doentes, desde o pessoal de saúde ao pessoal da limpeza. Tudo é feito mecanicamente! Nada é feito com alma.
As pessoas entram nas enfermarias a falar ao telemóvel, dos filhos, dos amigos, das férias etc, fazem o trabalho a falar ao telemóvel, muitas vezes entram e saem e nem uma palavra dirigem aos doentes.
Estranho não é?
Pergunto-me. Onde está a humanidade?
Pergunto. Onde está o amor por aquilo que se faz?
Pergunto. Qual é a prioridade num hospital?
Vi tanta falta de amor!!!